Foto: Agência Brasil/Arquivo
A Câmara dos Deputados aprovou o Projeto de Lei (PL) nº 976/22 na última quinta-feira (9) para garantir o pagamento especial de um salário mínimo a filhos, filhas e outros dependentes menores de 18 anos de mulheres que morreram simplesmente por serem mulheres: os/as órfãos do feminicídio.
Para entrar em vigor, o texto precisa também passar por análise, votação no Senado e, caso não sofra nenhuma alteração, dependerá da sanção do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. O valor da pensão em 2023 é de R$ 1.320 e será concedida a filhos e filhas biológicos ou adotivos e dependentes com renda familiar mensal per capita igual ou menor a 25% do mínimo, equivalente a R$ 330.
O PL de autoria da deputada federal Maria do Rosário (PT/RS), que tem como coautoras as deputadas Erika Kokay (PT/DF), Gleisi Hoffmann (PT-PR), Luizianne Lins (PT/CE), Natália Bonavides (PT/RN), Professora Rosa Neide (PT/MT), Rejane Dias (PT/PI) e Benedita da Silva (PT/RJ), determina que a pensão não poderá ser acumulada com benefícios previdenciários recebidos do Regime Geral de Previdência Social ou dos Regimes Próprios de Previdência Social. Nem pode ser associada pensões ou benefícios do sistema de proteção social dos militares.
Segundo Benedita da Silva, o objetivo é fazer com que o poder público ampare aqueles e aquelas afetados e afetadas diretamente pela violência de gênero.
“Iniciamos pensando justamente em criar condições dignas para as crianças e adolescentes que, além da perda das mães, vítimas de feminicídio, ainda ficam sem qualquer tipo de assistência por parte do Estado”, explica.
Dor irreparável
Segundo pesquisa dos institutos Patrícia Galvão e Locomotiva, de 2021, 57% dos brasileiros conhecem alguma mulher que foi vítima de ameaça de morte pelo ex ou atual parceiro. O levantamento aponta ainda que 37% conhecem uma mulher que sofreu tentativa ou foi vítima de feminicídio íntimo.
Muitas dessas pessoas, como Louise de Luca Gomes, tornaram-se órfãs a partir de agressões praticadas por homens com os quais conviveram.
Em 2014, a professora Andrea Câmara de Luca foi morta a facadas na cidade de Ponta Grossa (PR), enquanto a irmã de Louise, à época com 10 anos de idade, permaneceu trancada no quarto ao lado do local onde ocorria o crime.
O então companheiro de Andrea, Sandro Luiz Ramos Araki, foi condenado a 36 anos, sete meses e 15 dias de reclusão, mas não ficou nem 10 anos preso e cumpre a pena em regime semiaberto. Mesmo com passagem por agressão, tentativa de homicídio, extorsão qualificada pela morte, furto qualificado e cárcere privado qualificado. Louise cursou direito para tentar entender as leis do país e falou à Revista Mátria sobre o medo constante que ela e a irmã têm de que o criminoso reapareça.
Apesar de entender que a pensão é uma reparação do Estado por não fornecer um método totalmente eficaz de prevenção aos crimes, ela lembra que a perda nunca será compensada.
“Dinheiro nenhum vai trazer a minha mãe de volta. A falta que uma mãe faz na vida de uma pessoa, principalmente na da filha, é muito grande. Quantas vezes eu já entrei em caminhos tão errados e pensei, ‘nossa, precisava da minha mãe agora’. Mas eu não tenho mais ela porque um idiota achou que a vida dela não valia nada e ela poderia ser retirada. Trocaria qualquer valor para tê-la de volta”, diz Louise.
A luta continua
Caso seja aprovada, a pensão soma-se a outras medidas importantes, como a Lei 13.104, de 9 de março de 2015, conhecida como Lei do Feminicídio, que alterou o Código Penal e passou a tipificar o assassinato de mulheres em situação de violência doméstica e familiar ou em razão do menosprezo ou discriminação à sua condição como um crime hediondo.
Mas a mestre em violência doméstica contra as mulheres e coordenadora do Centro de referência e apoio à mulher Márcia Danfremon, Cláudia Poleti Oshiro, destaca que nenhum benefício pode justificar a ausência de políticas públicas para prevenção dos crimes.
“Precisamos ficar atentas para que essa pensão não seja forma de compensação para crianças e adolescentes, porque nada compensa. Precisamos continuar cobrando o investimento para prevenção do feminicídio por meio de políticas púbicas que protejam, empoderem e fortaleçam as mulheres. É fundamental que elas tenham acesso a apoio e se livrem de situações violentas”, alerta.
Para denunciar a violência contra a mulher, ligue gratuitamente 180. O serviço funciona 24 horas por dia em todo o país, todos os dias da semana.
Fuente: CNTE